PENSAR POSITIVO - Abordagem Conceitual e Científica

Muito se fala que a mente move montanhas. Você seria um ímã e atrairia tudo o que desejasse. A boa fortuna estaria ao alcance de suas mãos (ou melhor, da sua cabeça). Será? Uma atitude otimista faz um bem danado, sim. Mas ninguém consegue ficar rico só com a força do pensamento. Saiba como isso funciona

Pense. Em qualquer coisa. Numa casa, por exemplo. Imagine-a pintada de branco, com janelas azuis e cercada por um terraço com escadas que levam a um jardim. Ali estão margaridas, girassóis e uma árvore frondosa.

Nos 10 segundos que você levou para chegar até aqui, uma avalanche de sinais nervosos ocorreu no seu cérebro. No córtex (camada periférica dos hemisférios cerebrais), milhares de neurônios foram acionados e trocaram informações em frações de segundo. Arquivos de memória foram vasculhados e, sem que você pudesse controlar ou prever, a imagem de uma casa surgiu em sua mente. Por isso, você deve ter sentido um bem-estar, uma vontade de possuir essa casa de verdade.

Dentro de nossa caixa craniana ocorrem milhares de outros processos – esse que você acabou de perceber é o que podemos chamar de pensamento positivo, uma idéia que, nas prateleiras das livrarias, vem ganhando contornos de magia. Basta ter uma atitude otimista para atrair o que deseja. Dinheiro, amor, saúde, sucesso. Tudo. Qualquer coisa pode estar ao seu alcance se você pensar positivamente, com firmeza, dizem os autores de auto-ajuda.

“Aquilo em que você mais pensa ou se concentra se manifestará”, garante Rhonda Byrne. Essa australiana de 52 anos alega ter desenterrado uma verdade preservada a sete chaves por sábios, filósofos, cientistas e gente de sucesso. E revelou sua descoberta no filme O Segredo, que vendeu mais de 2 milhões de cópias em dvd no mundo inteiro. O livro homô­nimo, lançado por ela, também virou um fenômeno de público, com 6 milhões de exemplares vendidos em apenas um ano. Byrne resume o que descobriu em frases de efeito como: “Sua realidade atual ou sua vida atual é resultado dos pensamentos que você tem”. Hoje, uma legião de fãs segue seus ensinamentos.

Esse mistério alardeado por Byrne não é nenhum segredo. Já faz tempo que diversos escritores têm divulgado as benesses do pensamento positivo. Um dos primeiros a falar sobre o assunto, Norman Vicent Peale, autor de O Poder do Pensamento Positivo, em 1952 já dizia: “Mude seus pensamentos e você mudará seu mundo”. Hoje, a lista de livros que ensinam a usar os poderes da mente é quilométrica. Há o médico indiano Deepak Chopra (As Sete Leis Espirituais do Sucesso), o casal de videntes Esther e Jerry Hicks (Peça e Será Atendido), a palestrante motivacional Sandra Taylor (A Ciência do Sucesso), apenas para citar alguns dos mais badalados. Outro autor conhecido é o físico Amit Goswami (O Universo Consciente), cujo livro inspirou o filme Quem Somos Nós? (2005), espécie de documentário de auto-ajuda que recorre à física quântica para falar dos potenciais da mente.

Em comum, todas essas teorias têm o fato de recorrer a argumentos científicos para afirmar que é possível fazer o cérebro funcionar a nosso favor e gerar resultados surpreendentes. No caso da física, especialmente da física quântica, os autores nos comparam o tempo todo com elétrons (veja quadro na página 58).

Bastaria utilizar a técnica correta para colhermos os benefícios na saúde, trabalho e relacionamentos. É bom lembrar que, aos olhos da quase totalidade dos cientistas, essas teorias não fazem sentido nenhum. Por outro lado, a todo instante, deparamos com situações que parecem mostrar o contrário. O que dizer, por exemplo, de pessoas que parecem ter descoberto a fórmula secreta do sucesso e realmente se dão muito bem em tudo o que fazem? Ou dos otimistas a quem nada parece abalar? Ou ainda daqueles que dizem ter vencido doenças graças à atitude mental positiva? Relatos não faltam. Pois bem. Dentro deste caldeirão em que tudo parece ter o pensamento positivo como pano de fundo, você vai descobrir o que se fala a respeito, o que é fantasia, o que já foi comprovado e o que ainda permanece um mistério.

O que se diz por aí

Peça, acredite e receba. Simples assim é a fórmula apresentada por Rhonda Byrne, autora de O Segredo. “No momento em que você pede alguma coisa, e acredita, e sabe que já a tem no invisível, o Universo inteiro se move para deixá-la visível”, diz. No livro e no filme de mesmo nome, não faltam relatos de gente que conseguiu a cura de doenças, o amor ideal ou até um colar de diamantes como num passe de mágica. O segredo ensinado por Byrne é observar o Universo como uma lâmpada mágica – e se comportar como o Aladim. Ao esfregar a lâmpada – ou seja, ao pensar positivamente – seus desejos se materializariam. 

Na base dessa afirmação, está a crença de que os pensamentos são magnéticos e emitem uma freqüência poderosa capaz de influenciar as pessoas e coisas à nossa volta. De acordo com esse raciocínio, quando você pensa positivo, entra numa freqüência positiva e atrai coisas benéficas para a sua vida – o pensar negativo, segundo Byrne, causa o efeito inverso.

O guru indiano Deepak Chopra, outro astro que ensina como usar a mente positiva em seu benefício (ele orienta celebridades como Madonna), usa outro discurso para atingir o mesmo fim, ou seja: saúde, sucesso e riqueza. Segundo ele, o corpo deve ser entendido como um campo de energia que precisa estar em equilíbrio. Suas técnicas de meditação ajudariam na tarefa de chegar lá.

São centenas de teorias para quem deseja potencializar a mente. Os autores vêm de áreas diversas, da gestão de carreiras e esportes, passando pelo espiritismo e pela psicologia. Muitos afirmam ser especialistas em “potencializar a mente” e na “transformação pessoal”. Geralmente, elaboram suas teorias a partir das próprias experiências de sucesso e auto-superação. Dentro dessa babel de ensinamentos, porém, algumas idéias acabam se repetindo. É o tripé energia, magnetismo e holismo.

Energia, magnetismo e holismo

Para a física, de modo bem resumido, energia é a capacidade de um corpo executar um trabalho ou realizar um movimento (por exemplo, o fogo é uma fonte de energia empregada para cozinhar alimentos que, por sua vez, fornecem energia ao corpo). No caso da auto-ajuda, contudo, é bom você esquecer o que aprendeu na escola. Energia, segundo muitos desses autores, é uma força que anima todas as coisas, uma fonte de bem-estar e amor. Com o treinamento correto, ela poderia ser direcionada para todas as finalidades, inclusive as mais cotidianas – por exemplo, receber uma promoção no trabalho, achar uma vaga na garagem do shopping e evitar os quilos extras mesmo comendo além da conta. “Quando nos distanciamos dessa energia, surgem problemas, medos, carências e doenças”, diz a escritora Esther Hicks, em seu livro com o sugestivo nome Peça e Será Atendido.

O magnetismo (capacidade de alguns materiais se atraírem ou se repelirem) é outro conceito bastante apropriado pela literatura sobre pensamento positivo. A crença é que a mente atuaria como um ímã capaz de vibrar com força suficiente para atrair objetos e acontecimentos. Só que a idéia clássica da física de que pólos opostos se atraem não vale aqui. Pensamentos positivos atrairiam experiências positivas – e vice-versa. O escritor Michael Losier ilustra com um clássico exemplo: se você acordar mal-humorado, der uma topada na cama, queimar a torrada e não controlar a raiva, irá vibrar negativamente e atrairá vários problemas para o seu dia. No livro Lei da Atração – O Segredo Colocado em Prática, ele chama essa seqüência de causas e efeitos de Lei da Atração e diz que ela “sempre se harmoniza com sua vibração, seja ela positiva, seja negativa”.

Já o filme Quem Somos Nós? propagou outra idéia bastante popular: todos estamos interligados. “Você e eu somos um, há uma conexão invisível entre todas as coisas”, diz o filme. Esse conceito pode ser resumido numa única palavra: holismo (do grego holos, que significa “todo”). É mais ou menos aquela frase que diz: “Uma borboleta que bate asas no Japão pode causar um tornado no Brasil”. Alguns autores dizem que a nossa mente atuaria como a borboleta. E você, leitor, adestraria esse inseto como bem entendesse. Dessa forma, seria capaz de causar benefícios em série. Por exemplo: se você quiser muito uma resposta positiva de um emprego, vai conseguir não somente o trabalho como uma excelente colocação, um aumento de salário, viagens pelo mundo inteiro e logo um grande amor com quem terá 3 filhos lindos. É um efeito dominó.

Isso faz sentido?

A ciência, de um modo geral, vê o assunto com desconfiança, uma vez que faltam trabalhos acadêmicos reconhecidos para comprovar que essas teorias realmente funcionam. Em geral, os autores costumam apresentar muitos relatos de pessoas que afirmam ter tido sucesso com as técnicas de pensamento positivo – mas relatos isolados não provam nada, por mais incríveis que sejam. Existem normas que devem ser seguidas para um estudo ser levado a sério. É preciso observar o fenômeno, criar uma hipótese para explicá-lo, depois coletar dados relacionados àquilo que se estuda e, por fim, testar se a hipótese é realmente verdadeira. Esse processo pode demorar alguns anos.

O problema é que as teorias sobre o pensamento positivo costumam se apropriar de conceitos científicos para validar idéias que, como acabamos de falar, estão fora do campo da ciência. Nesse caso, a crítica mais aguda vem de áreas como a física e a neurociência. “Muitos tomam uma teoria e tentam generalizá-la para tudo”, diz o neurofisiólogo Roque Magno de Oliveira, professor da UnB.

Um exemplo é o uso do conceito de energia, que passou a significar algo diferente do que diz a física. “Na verdade, essas pessoas consideram energia aquilo que eu considero empatia. Isso não tem nada a ver com física, e sim com a psicologia das relações humanas”, afirma o físico Ernesto Kemp, professor do Instituto de Física da Unicamp. A física também rejeita a badalada Lei da Atração, que diz que os pensamentos criam campos energéticos à nossa volta. “O pensamento como energia, como uma espécie de campo que age a distância, é algo que nunca foi comprovado cientificamente”, explica Adilson José da Silva, professor do Instituto de Física da USP. Ou seja, nunca ninguém detectou esse tal “campo energético”. É verdade que, no cérebro humano, ocorrem estímulos elétricos o tempo todo. Mas, segundo Ernesto Kemp, os pulsos elétricos liberados durante as sinapses são tão fracos que a probabilidade de o campo eletromagnético que você está gerando com suas sinapses interagir com o de outras pessoas é nula.

Os neurocientistas, por sua vez, concordam que o estado de ânimo pode, sim, influenciar o nosso organismo de várias maneiras. Os hormônios associados ao estresse têm grande influência na consolidação da memória. Ou seja, a idéia de que pensar positivo faz bem não é absurda. “Quando estamos muito estressados, o nível dos hormônios secretados é alto e influencia negativamente esse processo”, afirma o neurocientista Martin Cammarota, pesquisador do Centro de Memória da PUC de Porto Alegre. De acordo com ele, não temos controle total sobre nosso cérebro nem sobre os processos químicos e celulares que ocorrem nele. “O ser humano é uma soma de circunstâncias. Por mais que você pense positivo, seus níveis de colesterol no sangue não vão diminuir somente em conseqüência disso”, ressalta. No caso do colesterol, dieta e exercícios são algumas das circunstâncias a ser consideradas.

Mas pensar positivo funciona?

Funciona. Mas não como a maioria das pessoas­ gostaria. O pensamento positivo não vai engordar sua conta bancária do dia para a noite. Nem fará carros e diamantes orbitar ao seu redor. Porém, segundo várias pesquisas, uma atitude otimista pode influenciar muito a resistência do organismo às doenças.

Uma comprovação disso veio da Universidade Harvard, nos EUA. Há 5 anos, um grupo de médicos da instituição descobriu que pensar positivamente pode fazer bem para os pulmões. Os pesquisadores avaliaram o estado de saúde de 670 homens na faixa dos 60 anos de idade. Também aplicaram testes de personalidade para identificar quem eram os otimistas e os pessimistas. Depois de 8 anos, constatou-se que a turma do bom humor tinha um sistema imunológico mais resistente a doenças pulmonares quando comparada ao grupo dos estressados. Até mesmo os fumantes otimistas apresentaram resultados melhores que os adeptos do tabagismo que eram, digamos, baixo-astral.

O coração também bate melhor quando estamos com bom humor. Os pesquisadores do Instituto Delfland de Saúde Mental, na Holanda, monitoraram homens com idade entre 64 e 84 anos durante 15 anos. A incidência de infartes e derrames foi menor entre aqueles que tinham uma atitude positiva. Os otimistas apresentaram ainda 55% menos risco de ter doenças cardíacas.

O que essas pesquisas revelam pode soar óbvio: pessoas com disposição para ver o lado positivo da vida tendem a cuidar mais da saúde, a praticar exercícios e se alimentar melhor. Porém, há outra explicação, que fala da relação entre os hormônios e o estresse – problema que os otimistas parecem enfrentar melhor em relação aos pessimistas. Longos períodos de irritação e melancolia influenciam a secreção de alguns hormônios. “No estresse crônico predomina a ativação do córtex das glândulas supra-renais com produção de cortisona, que é um hormônio imunossupressor, ou seja, que diminui a ação do sistema imunológico”, explica o médico Régis Cavini Ferreira, especialista em psiconeuroendocrinologia, uma área que estuda a relação entre cérebro, hormônios e comportamento. “Assim, evitando o estresse, o indivíduo tem melhor competência imunológica para se recuperar das doenças”, afirma. As glândulas supra-renais, aliás, parecem ser um dos principais termômetros do pensamento positivo no nosso corpo. Como o próprio nome diz, elas ficam na parte superior dos rins e sua função consiste basicamente na liberação de hormônios. Isso acontece como resposta ao nível de estresse a que formos expostos.

O poder da motivação

Quando o assunto sai da área de saúde e bem-estar, os resultados do pensamento positivo ainda são controversos – pelo menos no que diz respeito aos estudos acadêmicos. A ciência não confirma a eficácia do otimismo na obtenção de sucesso profissional ou do êxito em qualquer outra atividade. Contudo, não faltam exemplos de que alguma coisa parece funcionar a nosso favor quando adotamos uma atitude “para cima”. Ou melhor: quando estamos motivados. O técnico da seleção masculina de vôlei, Bernardinho, por exemplo, conhece bem os resultados que um time talentoso e focado no sucesso pode alcançar – como o pentacampeonato da Liga Mundial, o campeonato olímpico e o bicampeonato mundial. Há algum tempo, ele vem compartilhando sua experiência com grandes empresas, realizando palestras em que ensina os segredos do trabalho em equipe e da superação individual.

“Temos que buscar sempre a renovação e a qualificação individual. Cabe aos comandantes identificar líderes do grupo e trabalhar na motivação de todos para o sucesso coletivo”, disse Bernardinho em uma palestra na UnB. Nessa frase, ele resume alguns de seus principais pilares para o sucesso: superação, obstinação, treinamento, persistência, foco na liderança. E, claro, motivação. Misturando esses ingredientes com uma boa dose de trabalho, afirma o treinador, não tem erro. Pode ser nas quadras, no escritório, dentro de casa, na sala de aula.

A motivação é mesmo uma palavra de ordem dentro do vasto universo do pensamento positivo. No mundo dos negócios, ela veste uma roupagem mais elaborada, tem estratégias bem traçadas, baseadas no planejamento e na execução de metas.

É aqui que entra a programação neurolingüís­tica (PNL), uma outra referência quando o assunto é o poder da mente positiva. Criada nos anos 70 por um matemático e um lingüista americanos, a PNL ensina a reprogramar o cérebro por meio de exercícios envolvendo imagens, sons e toques. As técnicas, que ficaram populares no Brasil com os livros do médico Lair Ribeiro, são usadas para incrementar a criatividade, o aprendizado e a memória. Entre outras coisas, a PNL ensina que cada pessoa deve encontrar o seu “motivo” para entrar em ação, estabelecendo metas concretas e desejando ser extraordinária no que faz.

Os motivos que nos fazem agir são um assunto sério para a psicologia.  A motivação, nessa área de estudos,  é considerada o conjunto de fatores que impulsionam o nosso comportamento. Alguns são comuns a todo mundo, como a necessidade de se alimentar. Outros variam de pessoa para pessoa, como o desejo de realização e poder. “A motivação é aquilo que faz você levantar da cama todos os dias. E só você sabe quais são seus motivos”, afirma a psicóloga Valquíria Rossi, professora da Universidade Metodista de São Paulo. Pessoas motivadas geralmente têm objetivos claros e se esforçam para alcançá-los, e aí está uma parte da explicação para o sucesso. Por exemplo: se você está motivado a trocar seu Fusca por uma BMW, vai se esforçar para descobrir o que precisa fazer para mudar de carro e não desistirá facilmente.

Mas motivação não age sozinha. Ela deve estar aliada justamente ao otimismo. Em outras palavras: ao pensamento positivo. “Algumas pessoas têm predisposição para ver o futuro com mais otimismo e, então, assumem a responsabilidade pela própria vida e vão atrás do que desejam, sem responsabilizar os outros por eventuais fracassos”, diz ela. 

O negócio é que essas duas atitudes – motivação e otimismo – não podem ser adquiridas do dia para a noite. Insistir que deseja um carro se você, intimamente, está feliz andando de ônibus não vai motivá-lo a trocar de meio de transporte. E repetir “eu sou otimista” não vai transformar um pessimista de carteirinha em alguém “para cima”. Uma das coisas que contribuem para isso é a forma como fomos educados. Pensar positivo pode não ser fácil para alguém que cresceu ouvindo frases do tipo: “Não arrisque” ou “Não faça isso, pois não dará certo”.  “Se você cresce nesse tipo de família, provavelmente vai pensar assim”, afirma Valquíria.

Pensar negativo faz mal?

Depende. Em profissões que envolvem a previsão de riscos, por exemplo, um pouco de  pessimismo é até bem-vindo. Imagine um operador da bolsa que tem certeza que as ações irão subir. Ou um controlador de vôo que sabe que os aviões não irão colidir nunca. O pessimismo – que pode ser traduzido aqui como uma certa ansiedade e medo do fracasso – faz uma diferença bem positiva nesses casos.

Durante provas e exames, a tática de pensar positivo ou relaxar demais pode igualmente sair pela culatra. Nessas horas, uma pequena dose de estresse irá contar pontos a seu favor. Esse estresse agudo, ao contrário do crônico, não prejudica o sistema imunológico. “Quando o nível de produção dos hormônios associados ao estresse é moderado, ficamos em estado de alerta. Isso nos ajuda a manter a atenção e nos predispõe à batalha”, explica o neurocientista Martin Cammarota, do Centro de Memória da PUC de Porto Alegre. Atletas, por exemplo, costumam se sair melhor nas competições quando estão mais tensos, uma vez que secretam mais adrenalina. Nesse caso, o estresse é percebido pelo corpo como algo bom.

Claro que pensar repetidamente em coisas desagradáveis não faz bem para ninguém – inclusive, pode fazer mal à saúde. Segundo a psicóloga Susan Andrews, a longo prazo, a secreção do cortisol – um hormônio liberado em maior quantidade durante o estresse crônico – pode matar até 25% dos neurônios do hipocampo. Essa é a parte do cérebro responsável pela memória e pelo aprendizado. “Por isso, quando estamos muito estressados e irritados, ficamos confusos e esquecidos”, explica.

O médico Régis Cavini também investigou o pensamento negativo. Ele avaliou a relação entre a lembrança de acontecimentos traumáticos e o funcionamento do cérebro. Descobriu que, ao evocarmos uma memória traumática, a secreção de hormônios associados ao estresse aumenta como se estivéssemos revivendo aquela experiência. “Ao lembrarmos de um trauma, o vivenciamos outra vez em sua plenitude metabólica e emocional”, diz o pesquisador, que conduziu a investigação no Instituto de Psicologia da USP. Aí pode estar a explicação científica para a antiga idéia de que remoer­ o passado faz mal ou de que desejar o mal a alguém faz o feitiço virar contra o feiticeiro.

Alimentar idéias negativas, aliás, pode ser também um clássico sintoma de que algo não anda bem. “Às vezes, a pessoa sofre de depressão, ansiedade ou simplesmente aprendeu a ter pensamentos negativos ainda na infância com o pai e a mãe. E assim entra num círculo vicioso”, diz o neurofisiólogo e psicanalista Roque Magno, da UnB. A psicoterapeuta Eva Strum defende o acompanhamento médico para os casos em que o pessimismo se torna crônico. Lembra, ainda, que doses pequenas de pensamento positivo – conquistadas, por exemplo, durante a leitura de um livro ou em atividades lúdicas – podem ajudar. Há 6 anos, ela fundou a ong Pensamento Positivo, formada por voluntários que visitam hospitais de São Paulo para divertir os pacientes com jogos e músicas. “Ao brincar, você mexe com a endorfina, que é um medidor da sensação de dor. Quanto mais relaxado você fica, menos dor sente”, afirma. A equipe do Pensamento Positivo hoje percorre 11 hospitais paulistanos a cada semana. Para os voluntários, se a ciência comprova ou não os efeitos dessa terapia antipessimismo é o que menos importa.

Porque só se fala nisso

Desvendar os poderes da mente – essa insondável caixa cinzenta onde a vida pulsa e residem tantos mistérios – tem sido a meta de gerações. O assunto ganhou fôlego a partir dos anos 60, nos EUA, no auge da contracultura. Era a época das comunidades alternativas, da valorização do misticismo oriental, da preocupação com a natureza e dos experimentos com  drogas alucinógenas. Nesse caldeirão de novidades, surgiu o Movimento do Potencial Humano, que reunia psicólogos, gurus e adeptos de terapias alternativas. Essa turma afirmava que o ser humano possui capacidades inexploradas e que é possível transcender a mente com o uso de técnicas que envolvem desde a meditação até massagens especiais. As idéias fervilhavam principalmente no Instituto Esalen, na Califórnia, EUA, um famoso ponto de encontro de hippies, terapeutas, escritores e pesquisadores abertos a novas formas de conhecimento. Ali surgiu o que atualmente algumas pessoas chamam de new age – ou nova era –, uma mistura de práticas espiritualistas, terapêuticas e de auto-ajuda que influenciaram bastante a cultura de hoje em dia e o modo de viver de muitas pessoas.

Outros fatores também deram um empurrão na história do pensamento positivo como um tema que norteia a vida moderna: o individualismo, o avanço da ciência e o declínio das religiões tradicionais. Faz tempo que os mitos e dogmas religiosos deixaram de fazer sentido para muita gente. Os dois últimos censos demográficos do IBGE mostraram isso em números. Em 1991, a pesquisa revelou que 4,7% da população brasileira (7 milhões de pessoas) se declaravam sem religião. Em 2000, o percentual subiu para 7,4%, ou seja 12,4 milhões (veja reportagem na página 86 sobre o pensador ateu Richard Dawkins).

Na hora de entender os fenômenos do mundo ou encontrar respostas para seus anseios, cada vez mais pessoas recorrem à ciência ou às propostas da nova era. Aí, podem entrar em cena o misticismo oriental e outras novas formas de religiosidade. A auto-ajuda também pega sua carona aqui. A fé nos deuses cada vez mais dá lugar à crença no poder do homem – ou na mente do homem. “Em vez de esperar por  uma religião, as pessoas tomaram para si mesmas a tarefa da salvação”, observa o antropólogo Silas Guerriero, professor da PUC de São Paulo. “Salvar-se, nesse caso, tornou-se sinônimo de ser bem-sucedido, feliz, realizado, enfim, colocar em prática o potencial que cada um tem”, afirma.

Um outro ponto que contribui para esse conjunto de influências é o apelo crescente ao consumo desenfreado da sociedade em que vivemos. Para muita gente, o pensamento positivo é mais um meio de ter, comprar, possuir. Até mesmo muitas igrejas andam trabalhando nessa linha. Entre algumas neopentecostais, um ramo do protestantismo que emergiu nos anos 70, por exemplo, há o discurso de que o verdadeiro fiel pode “exigir” que Deus realize seus desejos. A única diferença é que, nesse caso, o caminho para alcançar o sucesso está na fé. Pensando bem, talvez nem exista diferença. Afinal, sem a comprovação da ciência, o poder miraculoso da mente, por muito tempo, pode continuar sendo apenas uma questão de crer ou não crer – e a escolha da crença vai do freguês. Pode ser em Deus, ou na própria mente.

Também não é exagero afirmar que o investimento no pensamento positivo pode ser encarado como uma forma moderna de escapismo. “Para muitas pessoas, isso é um alívio, pois essas técnicas irão poupá-las do trabalho de questionar qual o sentido de sua vida, o melhor caminho para seguir e a que atividades desejam se dedicar”, comenta a filósofa  Dulce Critelli, da PUC-SP. As dúvidas existenciais e o sofrimento dão lugar à busca desenfreada pela casa nova, pelo carro de luxo, pelo emprego dos sonhos, pelos amores incríveis.

Uma coisa é certa: os autores mais famosos do gênero conquistaram tudo isso. Em pouco mais de um ano, Rhonda Byrne acumulou uma fortuna de US$ 48,5 milhões. No mês de maio, ela foi eleita pela revista Time uma das 100 pessoas mais influentes do mundo. Deepak Chopra abandonou uma sólida carreira de médico endocrinologista para comandar o Chopra Center for Wellbeing (Centro Chopra para o Bem-Estar), um império da auto-ajuda sediado na Califórnia. Seus livros, cursos e palestras rendem a ele mais de US$ 15 milhões por ano. Se o sucesso deles veio graças ao pensamento positivo ou a idéias brilhantes aliadas a uma boa estratégia de marketing, não se sabe. Talvez esse seja o verdadeiro segredo.

Dinheiro amor saúde

Pensar positivo não faz carros e jóias orbitar ao seu redor. Mas uma atitude otimista pode, sim, ajudar na sua saúde e no seu bem-estar.

48,5 milhões de dólares. Essa é a fortuna acumulada por Rhonda Byrne, autora do livro O Segredo, em pouco mais de um ano.

"Cabe aos comandantes identificar os líderes do grupo e trabalhar na preparação e motivação de todos para  o sucesso."
Bernardinho, técnico campeão mundial de vôlei, medalhista olímpico.

Ciência ou auto-ajuda

É muito comum as teorias sobre pensamento positivo recorrerem à física quântica para legitimar suas idéias.
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